Fazenda Laguna – Criação de Búfalos no Ceará é referência nas Américas

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Nelson Prado não esconde estar realizando um sonho, mas deixa claro que o sonho lhe traz resultados para lá de reais, “se auto-financia”, como ele prefere definir. Há 16 anos comandando a criação de búfalos da Fazenda Laguna, no município de Paracuru, no litoral oeste cearense, o produtor tornou-se uma verdadeira referência da atividade no Estado, no País e até mesmo nas Américas. Começou meio que por acaso, após uma tentativa, digamos, frustrada, com bovinos.

 

Pesquisando o tema e desconstruindo mitos, Prado foi ganhando experiência e conhecimento. Hoje, além de produtor de derivados do leite de búfalo, o fazendeiro ganha com o material genético de seus reprodutores. Lembrando o começo, Prado conta que nem imaginava como o experimento daria certo. Paulista, o produtor desembarcou no Estado 35 anos atrás, vendendo máquinas agrícolas.

 

Comprou uma área no município praiano e resolveu investir na pecuária. Eram três propriedades, todas voltadas à criação de bovinos. No entanto, o seu lado de industrial – o hoje fazendeiro já havia trabalhado com siderurgia e mineração – inquietava-se com os números que não indicavam sucesso nos negócios. Foi com pouco mais de 10 anos como criador de gado que Prado decidiu que não daria mais para continuar com o rebanho bovino.
“Já conhecia búfalos desde 1984. Um primo meu criava e me incentivou a fazer o teste. Comprei um búfalo e algumas búfalas a custos baixíssimos”, conta. Em pouco tempo, os animais estavam gordos e dando bons resultados. Mas o produtor não havia acompanhado o desenvolvimento dos animais e acreditava que aquele resultado havia exigido custos altos demais. Vendeu os animais e resolveu recomeçar. Comprou outros 32 búfalos e começou a acompanhar de perto a criação. “Aí eu me entusiasmei”, afirma.

 

Com os resultados positivos, o produtor decidiu comprar outras 20 fêmeas e dois machos. Dessa vez, selecionados. “Tinha que vender três matrizes bovinas para pagar uma búfala”, calcula. Resolveu apostar: “Vendi a casa que tinha e investi em 30 búfalos”. Foi nesse processo de expansão que Prado chegou aos 205 hectares e 480 búfalos, entre crias e matrizes, todos da raça Murrah. Agora, trabalha em outra propriedade – esta exclusiva para a recria – de 316 hectares e 200 búfalos, todos registrados na Associação Brasileira de Criadores de Búfalos (ABCB). Como ele explica, nesse segundo espaço, ainda há muito a ser feito. Aos poucos, a pastagem vai sendo expandida. Tudo de acordo com a necessidade e as possibilidades.

 

Prado aponta as médias anuais de temperatura (23,5ºC, a mínima e 29,9ºC, a máxima), de pluviosidade dos últimos 30 anos (1.238 mm) e da umidade relativa do ar (78,3%) para desconstruir alguns dos mitos da criação de búfalos. Um deles é a própria criação em área praiana e a outra é de que os búfalos só vivem dentro da água. “Há também um mito que desconstruímos que é que o búfalo é um animal exótico que não serve para a produção”, complementa.

 

Os bons resultados são comprovados através dos dados zootécnicos alcançados na fazenda, onde búfalas de primeira lactação produzem em média 1.969 kg de leite, passando para 2.960 Kg em matrizes acima de duas crias, resultado do forte trabalho de seleção ao longo dos anos (Quadro1).

 

Quadro 1. Produção da búfala por lactação

Ordem do parto

Produção

Média/dia

Pico médio

1º cria

1.969kg

6,7kg

8,9kg

2º cria

2.646kg

8,7kg

12,3kg

+ 2 crias

2.960kg

9,8kg

13,6kg

fonte: Fazenda Laguna – Março/2008

 

A produção de leite é toda voltada para a fabricação de derivados. “O leite é muito nobre e deve ser usado para produtos frescos”, enfatiza. Queijo frescal, ricota, requeijão e coalhada são os principais produtos confeccionados na queijaria. Defendendo que “búfalo não produz leite, produz queijo”, Prado calcula que a criação produz uma média de 400 quilos diários de queijo, oriundos de duas ordenhas por dia. O leite é recolhido ao tanque de expansão até sua industrialização na queijaria da fazenda, administrada por Nelson Filho. Lá, a produção chega a 13 mil quilos de derivados por mês. A carne é vendida apenas esporadicamente, quando algum animal não está apto à produção de leite. Afinal, para o produtor, os animais devem seguir a “filosofia” do “comeu, pagou”.

 

De acordo com o Sr. Prado um das grandes vantagens do leite de búfala é o seu alto teor de sólido, bem superior ao dos bovinos, o que o torna ideal para a fabricação de derivados, tendo ainda o diferencial de apresentar menor teor de colesterol (Quadro 2).

 

Quadro 2. Comparação entre a composição dos leites de búfala e bovino

Componentes do leite

Búfala

Bovina

Proteínas

4,00%

3,50%

Lipídios

8,00%

3,50%

Lactose

4,90%

4,70%

Água

82,00%

87,80%

Colesterol Total

214mg%

319mg%

Fonte: Associação Brasileira de Criadores de Búfalos (ABCB)

 

A venda dos lácteos é feita exclusivamente em Fortaleza. E hoje não consegue atender a toda a demanda dos hotéis, hospitais e supermercados da Capital. Bem diferente do começo, quando o fazendeiro precisou fornecer gratuitamente quilos e quilos dos produtos para que o consumo fosse sendo estimulado. Anualmente, Prado investe para incrementar a produção. O crescimento médio por ano é de 20%.

 

Bom conhecedor dos números, Prado desenvolveu um software próprio que permitisse a ele acompanhar a produção pelo rendimento que ela lhe dá. Em outras palavras, o criador de bubalinos conhece a produtividade de cada animal e o cruzamento entre fêmeas e machos é orientado por essa informação. “A definição do animal é feita a partir da produtividade da família. A reprodução é programada para evitar a consangüinidade”, explica.

 

Reforçando o autofinanciamento da produção, o fazendeiro afirma que o laticínio sustenta o dia a dia da fazenda, enquanto o trabalho com o material genético sustenta o investimento feito na propriedade. O investimento na genética dos animais começou quando comprou um reprodutor de alto potencial genético, pertencente a Otávio Bernardes, primo do produtor – o mesmo que o incentivou a iniciar a criação dos búfalos – e presidente da ABCB. O potencial do touro foi identificado pela Universidade Federal do Pará e o animal levado para lá, onde fez testes e cruzamentos com outras fêmeas.

 

A instituição tornou-se uma parceira de Prado. Até hoje, essa relação é estimulada, com o envio do touro para as instalações da universidade e a transferência de conhecimento ao produtor com os estudos desenvolvidos naquele estado. Hoje, a Fazenda Laguna dispõe de nove touros doadores de sêmen. Esses animais abastecem criadores brasileiros, universidades e centros de pesquisa.

 

Mais que o Pará, o criador tem contatos com intutuições do Sul e Sudeste do País, além de criadores da América do Sul. Uma vez que o produtor não encontra grandes fontes de conhecimento teórico em Fortaleza, é dessas fontes que Prado busca novas informações sobre os bubalinos. “Há algum tempo recebi uma homenagem na Venezuela pela contribuição à bubalinocultura nas Américas”, conta.

 

A experiência do criador teve que ser dividida com os funcionários, incluindo aí peões e técnicos. Ainda no início do processo, um dos funcionários foi mandado a São Paulo para aprender sobre o manejo e, de volta à fazenda, atuou como um verdadeiro multiplicador. Ao todo, são 47 pessoas empregadas, todas com carteira assinada, como Prado faz questão de destacar. Enquanto a queijaria conta com a assistência do professor de Engenharia de Alimentos, Antônio Cláudio Guimarães, o rebanho fica sob os olhos do médico veterinário Antônio Nogueira Magalhães, responsável pelo controle sanitário e reprodutivo dos animais.

 

O profissional acompanha a criação desde o início e foi aprendendo junto ao produtor e aos resultados que iam se dando. Hoje, divide com outros pesquisadores do assunto os conhecimentos que adquiriu em campo. Magalhães explica que para cuidar dos búfalos, muitos métodos são reproduzidos da criação de bovinos. É assim com a vacinação contra doenças como febre aftosa, brucelose, pneumoenterite, leptospirose, clostridioses e carbúnculo.

 

No entanto, algumas diferenças são percebidas no período reprodutivo. Como ele explica, diferente da fêmea bovina – na qual o cio é facilmente perceptível –, a bubalina só tem seu período reprodutivo identificado pelo próprio macho da espécie. Na fazenda, são utilizados os rufiões vasectomizados. Com isso, a búfala ou é deixada na monta natural ou levada para a inseminação artificial, onde se inicia o processo.

 

A monta natural é liberada após a novilha atingir seus 350 quilos, um momento considerado ideal para que se inicie a produção leiteira. As matrizes têm sua reprodução programada a fim de controlar a oferta de leite. Além disso, a atenção genética é fundamental, tendo em vista que se busca também a produção de reprodutores. Como explica o produtor, na procura de identificar matrizes cada vez mais produtivas, a partir dos 10 meses até o primeiro parto, as fêmeas são mantidas em área de manejo rotacionado, cuja alimentação ganha uma suplementação protéico-energética.

 

No que se refere ao manejo, os animais são criados em sistema intensivo, estabulado e semi-intensivo com pastejo rotacionado. Ao todo, são 28 hectares de capim napier e outros 36 de brachiaria. A imersão só é permitida em períodos de chuvas. A alimentação é feita ainda com cana de açúcar e capim, a proporções que irão depender da época do ano. Esse alimento é produzido ali mesmo na fazenda, em 60 hectares irrigados a partir de 40 poços artesanais, por sistema de aspersão, além de outros 30 hectares de brachiaria recém-implantados e ainda não cobertos por sistema de irrigação. A mineralização é feita via suplemento protéico-energético, disponibilizada nos cochos específicos.

 

Exemplo de dedicação, perseverança, disciplina e profissionalismo Sr. Nelson Prado e a Fazenda Laguna são exemplos de sucesso e dignos de reconhecimento a nível mundial.

 

Curiosidades:

 

– Cerca de 7% de todo o leite consumido no mundo é oriundo das búfalas.
– Não contendo caroteno, mas sim a própria Vitamina A, o leite de búfalas é totalmente branco, diferente do bovino, levemente amarelado.
– A verdadeira mozzarella italiana é feita exclusivamente com leite de búfala, havendo referências de sua produção naquele país desde os tempos bíblicos.
– Na Índia, segundo país mais populoso do mundo, com apenas 30% da população de bovídeos, os búfalos produzem 70% de todo o leite consumido.
– O leite de búfala é mais doce, mais nutritivo e com menor teor de colesterol que o leite bovino.
– Após o acidente nuclear em Chernobil, na antiga União Soviética, o leite de búfala foi o alimento que mais rapidamente eliminou os resíduos de radioatividade, a ponto de ser considerado alimento estratégico para o caso de catástrofes nucleares.
– Na Itália, país de origem da mozzarella, não se permite o uso deste nome caso o produto não seja elaborado exclusivamente com o leite de búfalas.

 

Núcleo de Comunicação: L&N